31 dezembro, 2009

Minderico em ementas e placas da escola


Alunos da Escola Secundária de Mira de Aire preservam a linguagem local utilizada nas feiras e mercados de outros tempos. Dois investigadores e o comandante dos bombeiros participam neste projecto, que começou este ano lectivo.



Antes de tudo, convém perceber o que é o minderico, recorrentemente apelidado de dialecto local. Anabela Esteves, professora de Área de Projecto e Tecnologias da Informação e Comunicação da Secundária de Mira de Aire, faz as devidas correcções. "O minderico não é um dialecto porque, tendo em conta o seu contexto sociogeográfico, isso implicaria que fosse um dialecto do português - o que é completamente incorrecto". "Um dialecto, de forma bem simplista, implica uma base linguística comum, que se disforma geograficamente. Isso não acontece com o minderico: quando um falante de minderico usa a sua língua com um falante de português sem conhecimentos de minderico, este não o entende", acrescenta.

O minderico era um sociolecto, uma língua secreta usada por um determinado grupo social que ao longo do tempo se alargou a outros estratos da população, entrando no quotidiano de uma zona geográfica. É uma variedade linguística própria, com características fonéticas e morfossintácticas peculiares que o afastam do português bem como de outras línguas românicas, e com duas variantes regionais: a de Minde, que está mais desenvolvida e padronizada, e a de Mira de Aire. O isolamento geográfico permitiu a conservação desta variedade linguística única.

Desde o início deste ano lectivo que os 18 alunos da turma do 8.º A da escola Secundária de Mira de Aire estão mergulhados num programa especial, que pretende revitalizar e trazer para o dia-a-dia dos Mirenses a linguagem utilizada nas feiras e mercados de antigamente - a piação. A Direcção da escola lançou o desafio, a professora Anabela Esteves não quis perder a oportunidade. O projecto passa por identificar espaços e estabelecimentos, elaborar ementas e cartazes na língua que é marca da identidade cultural da região, para preservar o património cultural e linguístico.

Há várias etapas a cumprir. Pesquisar e recolher palavras na piação com a ajuda do comandante dos bombeiros, Carlos Alberto, documentar as palavras com a ajuda da investigadora e linguista Vera Ferreira, criar uma base de dados, traduzir para piação todas as placas identificativas do espaço escolar, traduzir as ementas da cantina. Elaborar folhetos informáticos com palavras na piação por categorias, criação de músicas na piação, compilação dos trabalhos realizados ao longo do ano, e ainda divulgação do trabalho no site, no jornal da escola e em todo o recinto escolar. Tarefas que vão ocupar os 18 alunos até ao final deste ano lectivo.

O projecto foi apresentado no início do ano lectivo numa aula de Área de Projecto. "Os alunos adoptaram uma postura de grande participação e interesse sobre o assunto. Estão muito curiosos e entusiasmados" revela Anabela Esteves. O director da escola convidou Vera Ferreira, investigadora da Universidade de Munique e Regensburg, que se encontra a desenvolver um projecto sobre o minderico, o assistente Peter Bouda, também investigador da Universidade de Regensburg, e Carlos Alberto, comandante dos bombeiros voluntários.

Aguardam-se agora novos desenvolvimentos para este projecto. O director da escola, João José Almeida, sonha já com a criação de uma disciplina opcional de minderico que funcionaria como alternativa para os alunos do 3.º ciclo. "Mas, para isso, é necessário encontrar parceiros, estabelecer protocolos, solicitar apoios e, acima de tudo, muita persistência e compreensão por parte das entidades responsáveis", refere Anabela Esteves.
Publicado em "EDUCARE.PT"

3 comentários:

Anónimo disse...

Também no Agrupamento de Escolas de Minde estão a ser dados passos bastante significativos no projecto Minderico, estando, há já algum tempo, assinado protocolo/acordo de colaboração entre a Direcção do Agrupamento e os drs Vera e Peter Bouda. Está já a funcionar um clube/gabinete do Minderico; estão a ser ultimadas placas identificativas para todos os espaços da escola sede; está a ser preparado pelos alunos de 9º ano, livro de ementas, a divulgar na recriação da Feira de Santana de 2010; os documentos orientadores do Agrupamento têm já referências à piação dos Charales do Ninhou; na disciplina de oferta de escola, vão já iniciar, durante o mês de Janeiro, aulas em Minderico para o 8º ano (com professora externa à escola, nativa e falante de minderico), nos computadores da escola está instalado um programa de aprendizagem desta "língua" com grande adesão por parte de alunos e profs; estão em curso diligências (com os investig Alemães),de proposta de programa de Minderico a enviar ao Min. da Educação; a revitalização do Minderico é uma das prioridades estratégicas do Projecto Educativo do Agrupamento de Minde.

PM disse...

Parabéns ao Agrupamento das Escolas de Minde. São iniciativas fundamentais e de extrema importancia neste projecto que deveria envolver de todo o Ninhou.
Força!!!

IPE disse...

Estes iluminados dos nossos vizinhos continuam a bater na tecla da existência de uma versão de minderico própria de Mira d' Aire?!

Isto é mesmo ridículo!

Já deixaram cair a ideia perefrina do Calão Mirense. Agora avançam, em pezinhos de lã, com uma alternativa: a derivação regional do calão minderico, que será o mirense, colocado em pé de igualdade com o minderico...!!

É uma lata tremenda. É uma tentativa de furto de património histórico e cultural, que deve ser repudiada e imediatamente denunciada. Deve ser alvo de crítica e não de elogio.

ps: parabéns às escolas de Minde, ao Caorg, à Dra. Vera Ferreira e a todos aqueles que têm trabalhado e lutado para manter o minderico vivo.