21 agosto, 2009

Porto de Mós- Minderico poderá ser ensinado nas escolas de Mira de Aire




O Agrupamento de Escolas de Mira de Aire quer levar o calão minderico até às salas de aulas, no próximo ano lectivo.

João José Almeida, director do agrupamento, revela que, no arranque do ano, vai lançar o desafio aos professores para que, na Área de Projecto, seja desenvolvido um trabalho que leve os alunos a fazer recolha de expressões e a elaborar textos usando a dialecto, criado pelos comerciantes de Minde e Mira de Aire para comunicarem entre si sem serem compreendidos.
O professor explica que, já no ano passado, foram feitas algumas acções pontuais, com a colaboração da avó de uma aluna, mas pretende-se agora promover um trabalho “mais consistente”, que possa resultar numa publicação, não só com a vertente de dicionário, mas também com textos feitos a partir de expressões do minderico. João José Almeida gostaria ainda que a ideia fosse também abraçada por alunos dos cursos do Centro Novas Oportunidades. “O minderico faz parte da história e da cultura de Mira de Aire e que, por isso, deve ser preservado, sob pena de cair no esquecimento e desaparecer”, diz aquele docente, para quem a escola tem um papel importante a desempenhar na salvaguarda desse património.

Carlos Alberto Rosa, comandante dos Bombeiros de Mira de Aire e um dos poucos falantes do minderico na vila, aplaude o esforço do agrupamento de escolas, manifestando-se “totalmente disponível” para colorar com o projecto. O responsável frisa que já existe um dicionário de minderico, da autoria de Abílio Martins, antigo professor residente em Minde, mas sublinha que em Mira de Aire há termos “completamente diferentes”.

Apesar de se contarem “pelos dedos da mão” as pessoas que ainda sabem usar a “piação dos charales do ninhou”, que é como quem diz “a maneira de falar dos mindericos”, Carlos Rosa acredita que ainda é possível evitar a extinção do calão. “A partir da década de 60 do século passado, o minderico caiu em desuso”, refere o comandante dos bombeiros, que explica esse declínio com a emigração e com “vinda para Mira de Aire de muitas pessoas de fora”. Por outro lado, “os negociantes deixaram de andar de terra em terra, ficando sem necessidade de recorrer ao dialecto secreto”.

Dialecto renasce em Minde
O minderico renasceu em Minde, depois de Vera Ferreira, uma linguista portuguesa que fez pós-doutoramento na Alemanha, ter defendido a necessidade de preservar o dialecto. O seu projecto foi apoiado financeiramente pela Fundação Volkswagen e integrado no Programa de Documentação de Línguas Ameaçadas em todo o mundo. De acordo com o Público, o entusiasmo é tanto em Minde, que já se realizam aulas semanais, há propostas para a instalação de placas toponímicas e para o trânsito bilingues, a publicação de livros em minderico, a utilização do sociolecto em eventos locais, ementas de restaurantes, software e um dicionário multimédia, entre outras iniciativas. Um dos objectivos essenciais é o reconhecimento político do minderico como língua oficial, à imagem do que aconteceu com o mirandês, em Miranda do Douro.
Maria Anabela Silva in "JORNAL DE LEIRIA"

4 comentários:

PM disse...

Pelo menos já aprenderam alguma coisa, e já lhe chamam Minderico ou Piação do Ninhou, em vez do tal Calão Mirense.

Vera Ferreira disse...

Mas o curioso é continuarem a falar de soliciolecto ou calão e depois usarem os argumentos apresentados na notícia do Público para a classificação como língua. Penso que há uma certa falta de consenso quer nas classificações que usam quer na apresentação do trabalho jornalístico.

Não excluo nem nunca exclui a possibilidade de haver uma continuidade do minderico de Minde para Mira de Aire (é aliás uma consequência lógica da sua história e evolução) e uma análise e investigação nas duas vilas (enquanto continuum linguístico) é necessária e está obviamente programada. Na minha opinião de linguísta que até agora não manifestei na discussão à volta do minderico relativamente à sua área geográfica e sem querer colocar aqui ou alí a sua "sede" natal, penso que quer em Minde quer em Mira de Aire estamos perante o mesmo fenómeno linguístico (como referi acima uma espécie de "dialecto continuum") e não dois fenómenos linguísticos distintos. Se se trata de continuum como afirmo que seja e é o que corresponderia à sua evoluação natural dada a proximidade das duas áreas, iremos encontrar além de muitas semelhanças algumas particularidades que devem ser estudadas (coisa que já estou a fazer!). Tudo isto vai ao encontro do que tenho afirmado desde sempre: que o minderico actualmente é uma língua (e não um SOCIOLECTO ou mais vulgarmente calão e muito menos dialecto) e como tal apresenta também variações internas (fonéticas, lexicais e até mesmo morfosintácticas), umas mais nítidas e vincadas que outras.

Se o objectivo principal quer para os mindericos quer para os mirenses é o reconhecimento e protecção do Minderico, o essencial será um trabalho não paralelo mas conjunto para o qual eu enquanto linguísta e penso que todos os mindericos enquanto falantes estaram dispostos.

Contém com o meu apoio mas só vos pedia para terem mais cuidado nas classificações e terminologias que usam. O minderico não é um dialecto do português e ultrapassou há muito tempo as barreiras de sociolecto ou calão. Estamos a lidar com uma realidade linguística autónoma e independente!

Vera Ferreira

PM disse...

Apoiado, cara Dra. Vera.
Se os Mirenses querem aprofundar os seus estudos e divulgação sobre o Minderico, a Piação só terá a ganhar com isso.
Talveez, agora, esteja na altura de lhes ser explicado que o Minderico é uma língua e não um dialecto ou socioleto.
Também em Minde andamos muitos anos (e ainda existe esse hábito) de lhe chamarmos calão.

Aproveitando a sua próxima estadia em Minde, porque não uma sessão de esclarecimento em Mira de Aire?
É uma sugestão, e até uma possível divulgação para que os Mirenses possam começar a frequentar as aulas em Minde.
Até breve.

vmcs disse...

Drª Vera
Talvez seja interessante consultar este documento:

Sucinto Vocabulário - Coligido numa aldeia da Serra de Albardos, Concelho de Alcanena - SERRA DE SANTO ANTÓNIO
F. Santos Serra Frazão


Ver aqui: http://www.minderico.com/minderico/seccao.asp?cod_seccao=53135


Cumprimentos

vmcs